Sim, os resultados da Copa do Mundo de futebol influenciam o humor dos eleitores na suas escolhas para a Presidência da República. Tem sido assim desde 1994. O problema é que a influência do futebol nas eleições não segue lógica para lado algum. Não existe um padrão de benefícios a quem está no poder ou a quem quer alcançá-lo. A influência também não tem sido duradoura a ponto de fazer-se sentir por si quando chega o pleito, três meses depois do final da Copa.
Em 1994, quando a seleção brasileira embarcava para a Copa dos Estados Unidos,
FHC (PSDB) já liderava a disputa contra Lula (PT), com nove pontos de vantagem.
Em 17 de julho de 94, o Brasil foi campeão do mundo. Pesquisa da semana seguinte
ao título mostrou FHC com 32%, e Lula com 29% das intenções de voto. Empate
técnico, de acordo com o Datafolha, responsável pelos números aqui citados. O
título de campeão poderia beneficiar a então oposição petista?
Não.
Foi só um espasmo. Nas semanas seguintes, a vantagem em favor de FHC aumentou
para sete pontos, depois foi para 17 e chegou à véspera do primeiro turno em 26
pontos. A vitória de FHC, no embalo do Plano Real, só esteve ameaçada na semana
seguinte ao título.
Em 1998, quando a seleção embarcou para a Copa da
França, o já presidente FHC buscava a reeleição. Tinha margem apertada à frente
do oposicionista Lula, 33% a 30%, um empate técnico. O Brasil chegou à final da
Copa. Três dias antes do jogo decisivo, pesquisa mostrou que FHC havia disparado
e estava 12 pontos à frente de Lula (40% a 28%). Em 12 de julho, a seleção
prostrou-se ante os franceses. Perdeu por 3 a 0. A turma do quanto pior melhor
vibrou. Mas o resultado eleitoral não mudou. FHC chegou ao dia da eleição com 23
pontos de vantagem sobre Lula.
Em 2002, quando a seleção embarcou para
Coreia e Japão, o oposicionista Lula tinha 19 pontos à frente do situacionista
José Serra. O Brasil jogou e venceu. Dias depois do triunfo incontestável sobre
a Alemanha, pesquisa mostrou que a eleição de Lula corria risco de contestação.
Não pelo candidato do governo (Serra), mas por outro oposicionista, Ciro Gomes.
A folgada margem de Lula havia se reduzido a apenas cinco pontos. Ciro começou a
Copa com 11%, passou para 18% após a segunda fase e terminou-a com 28%. Lula
tinha 33%. Parecia que haveria novo líder. Mas a candidatura de Ciro esvaiu-se,
e Lula chegou ao dia do pleito com 27 de pontos de vantagem sobre
Serra.
Em 2006, quando a seleção embarcou para a Alemanha, Lula tinha
vantagem de 17 pontos sobre Geraldo Alckmin (PSDB). O Brasil tropeçou contra os
franceses mais uma vez. A vantagem de Lula oscilou um ponto. Um mês depois da
derrota daquela equipe anêmica, a vantagem de Lula havia sido vitaminada.
Aumentara para 23 pontos, mantendo-se em torno desse patamar até o
pleito.
Em 2010, quando a seleção brasileira embarcou para a África do
Sul, Dilma (PT) e Serra (PSDB) estavam empatados com 36% dos votos. A primeira
vinha em ascensão, o segundo em declínio. O declínio do time nacional era maior.
Eliminado nas oitavas-de-final pela Holanda. Dilma assistiu ao jogo com 39% das
intenções de voto, Serra com 37%. A derrota nacional podia ajudar a oposição.
Não ajudou. Um mês depois, Dilma abria oito pontos de frente. Chegaria à véspera
do pleito com 18 pontos de vantagem.
Neste ano, quando a seleção se
reuniu em Teresópolis, Dilma tinha 37% contra 19% de Aécio Neves (PSDB). A
vantagem cai de 18 para 15 pontos um mês depois. Voltou a 18 pontos antes da
eliminação estrondosa da seleção brasileira. Nenhum grande instituto havia
protocolado registro de pesquisa na manhã desta quarta-feira. Então novas
pesquisas só a partir da semana que vem. Elas mostrarão como o futebol afetou o
humor do eleitor. Sempre afeta de alguma forma, sem que os beneficiários sigam a
lógica única do futebol.
Há outros fatores e vetores. Futebol influencia, mas
não decide. A Copa começa em junho, termina em julho. A eleição se conclui três
meses depois.
Há uma imensidão de fatos e leituras políticas entre as duas
datas. Distância equivalente a muitos Maracanãs políticos.
Novas
emoções, novos desesperos
Um mergulho nos jornais de 1950
permite pinçar algumas palavras que agora podem ser revitalizadoras. Não dá para
comparar com precisão, mas a desolação, naquela primeira Copa do Mundo no
Brasil, parecia do nível da de agora, 64 anos depois.
Mário Filho
(1908-1966) escreveu no Globo Sportivo de julho de 1950:
“A derrota foi
um golpe. Ninguém deixou de senti-lo. O silêncio chegava a assustar. Era a
desolação da derrota. A multidão ficou parada sem querer acreditar no que via. O
estádio não se enchera para aquilo.”
O flamenguista José Lins do
Rego (1901-1957) foi trágico:
“Aquilo me doeu no coração. E de repente,
chegou-me a decepção maior, a ideia fixa que se grudou em minha cabeça. A ideia
de que éramos mesmo um povo sem sorte, um povo sem as grandes alegrias da
vitória, sempre perseguido pelo azar, pela mesquinharia do destino. A vil
tristeza de Camões, a vil tristeza dos que nada têm que esperar, seria assim o
alimento podre dos nossos corações.”
Mas, aos poucos, o discurso
perdeu passionalidade e ganhou razão, como o poeta gaúcho Vargas Netto
(1903-1977) escreveu:
"Mas, senhores, por que devo eu receber pêsames?
Pêsames merecem todos os brasileiros e, principalmente, os atletas e dirigentes
do futebol nacional. Eu sou um cidadão como outro qualquer. Sinto a derrota do
Brasil como os que mais a sentiram, mas não tenho cargos nem responsabilidade
alguma. Não os tenho nem quero tê-los."
E o escritor mineiro Antonio
Olinto (1919), deixou em 1950 a convocação que se renova hoje:
“Agora
começamos, pouco a pouco, a voltar à vida. As paisagens se reconstituem,
adquirem movimento, retomam seus lugares. Dentro em pouco, o futebol estará
novamente dominando as multidões. Haverá novas emoções. Novos desesperos.
"
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